segunda-feira, 16 de agosto de 2010

De repente se sentiu só. Muito só. Tão só quanto qualquer criatura era capaz de se sentir naquele lugar escuro e cheio de gente que esbarrava nela. O cheiro de suor das pessoas de desodorante vencido e de perfume barato misturado aos hálitos quentes de todos aqueles desconhecidos deixava o ar saturado e quase irrespirável, tóxico. Por alguns segundos pensou se não era melhor quando o cheiro de cigarro mascarava aquilo tudo, mas logo afastou aquele pensamento, antitabagista convicta que era. A música alta, a luz era tão fraca que parecia rodeada por sombras, figuras disformes cuja existência só lhe parecia irrefutável porque a tocavam a todo momento, empurrando-a pela pista de dança. Já não sabia mais se estava dançando ou apenas se deixando levar pelas danças alheias. Aqueles toques acidentais causavam-lhe um certo desconforto, quase uma ojeriza. Ouvia pedaços de conversas destinadas a outros ouvidos interrompendo a música a que tentava desesperadamente se agarrar. O teto baixo, os sussurros, os vultos em sua volta, a dificuldade para respirar, tudo começava a parecer mais um pesadelo que realidade. Se perguntou se era assim que se sentiam as pessoas numa crise de pânico, mas apesar de tudo, estava extremamente calma. Havia um conforto estranho naquele desconforto. Não saberia explicar se perguntassem, mas não havia ninguém para perguntar. Era livre para não entender, para não saber, para não pensar. Sentiu algo molhado. Alguma bebida derramada que espirrou nela. Um arrepio, nojo, mas o que ficou foi a curiosidade. Que bebida seria aquela? De quem? Como fora derrubada? Avistou o banheiro não tão longe e achou que era melhor se limpar. Não que fosse possível conseguir muita limpeza naquele banheiro já usado por incontáveis bêbados. Aproveitou para jogar um pouco de água no rosto para aliviar o calor. Talvez fosse melhor sair um pouco em busca de ar fresco. Andando, sentiu um toque proposital. A mão na sua bunda. Ah, o ódio começou a esquentar seu sangue. Pensou ter ouvido um "Gostosa", mas já estava tão fora de si, que pode ter sido um delírio. Antes que pudesse pensar, sentou-lhe a mão na cara, mas não ficou por lá tempo o suficiente para ver a reação. Na verdade não viu nem o rosto do indivíduo. Foi embora se sentindo violada. Seu paraíso era justamente estar incógnita, sozinha, livre.